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| Desfile japonês em São Paulo, bairro Liberdade. |
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Comércio de rua na Liberdade. |
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| Imigrantes japoneses viajando de trem. |
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| Imigrantes no abrigo de imigração em São Paulo. |
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| Hospedagem no abrigo. |
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| Kasato Maru, atracado no porto de Santos. |
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| Cartaz de propaganda japonesa emigração. |
8. Eis nosso
japonês.
O Brasil, desde as
últimas décadas do segundo império, sofria com a falta de mão de obra para o
trabalho na agricultura. Acordos internacionais restringiram a vinda de
escravos da África e aqui leis restritivas como: A Lei dos Sexagenários, Lei do
ventre livre, diminuiam a força de trabalho. Por outro lado a necessidade de
expansão da produção exigia mais braços para o trabalho. O recurso foi
estimular a imigração. Os europeus eram estimulados a virem ocupar o espaço
livre, especialmente italianos, alemães, poloneses e outros. Existia uma
restrição com relação aos asiáticos, por serem considerados pelos ocidentais
como uma raça inferior e com religião totalmente diversa.
O Japão abriu-se para o
comércio mundial depois de 1846, com o término do Xogunato Tokugawa. Foram 265
anos de isolamento, terminando com uma agricultura limitada a produzir apenas o
suficiente para o consumo, sem permitir a formação de estoques para enfrentar
catástrofes. Iniciou-se uma rápida mecanização da agricultura, provocando o
desemprego ou endividamento rual. Os proprietários insolventes perdiam suas
terras para os credores. Isso gerou um aumento na população urbana, onde não
existia emprego para tantos braços. A
solução era negociar com países com território capaz de acolher o excedente
populacional.
Houve o início de
negociações com o Brasil nos anos 60/70, porém somente em 1895 foi assinado um
acordo nesse sentido. Houve inclusive a lei nº 528 de 1890, assinada por
Floriano Peixoto, proibindo a imigração de asiáticos. Um decreto sob o número
97, posterior, tornou essa lei sem efeito. O primeiro embarque foi suspenso na
véspera, devido à queda internacional nos preços do café, motivada por uma
superssafra ocorrida naqueles anos. Situação essa que persistiu até 1906. Em 1907
um pequeno grupo formado por profissionais liberais como juizes, advogados e
outros, estabeleceu-se em território do Estado do Rio de Janeiro. A inexperiência,
falta de apoio e aparente esgotamento do solo, levou o projeto ao fracasso.
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| Imigrantes desembarcando em Santos. |
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| Passageiros do Kasato Maru no porto de Santos (desembarque) |
Em 1908 o navio Kosato
Maru, desembarcou 781 imigrantes no porto de Santos. Era o primeiro contingente
significativo de trabalhadores vindos do oriente. Seguiram-se outros grupos até
1914, quando ocorreu uma interrupção até 1917, quando terminou a Primeira
Guerra Mundial. Nesse período, especialmente nas décadas de 20/30 ingressou no
Brasil um enorme contingente de imigrantes japoneses. Muitos deles vinham
pensando em fazer fortura e voltar para o Japão. Por isso sequer se preocuparam
em aprender o idioma.
As dificuldades de
adaptação ao clima, remuneração reduzida e o trabalho pesado, levaram muitas
famílias a abandoner o campo nos primeiros anos. Já um bom grupo conseguiu
estabelecer com os proprietários parcerias que ao final de um período de sete
anos lhes dava direito a um pequeno pedaço de terra, além de serem donos de
tudo que produzissem além do café que tinham que formar. Sendo a primeira safra
de sua propriedade. Assim, após alguns anos, começou a existir em todo interior
um considerável grupo de pequenos proprietários de terras.
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| Familia de imigrantes cultivando sua terra. |
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| Imigrantes peneirando café. |
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| Imigrantes derrubando mato. |
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| Imigrangtes capinando cafezal. |
Era de esperar que os
donos não iriam entregar a eles as melhores terras, destinadas às seus
cafezais. A vantagem dos agricultores japoneses era serem acostumados a
trabalhar em locais difíceis. O território de sua patria é em grande parte
acidentado, com pouco solo fértil e em grande parte de difícile cultivo. Assim,
optaram por plantar bananas, abacaxi, arroz e outras culturas, que ofereciam
retorno em menos tempo que o café.
Hiromoto Sakaguti,
casado com Sakira Kumabe, Hiroji Fujita, casado com Kisoku Yamashita, estavam
entre esses. Junto com os filhos que nasceram depois de virem trabalhar aqui,
trabalharam por mais algum tempo para os patrões no café, enquanto faziam suas
lavouras de subsistência. Logo perceberam a carência de hortaliças no mercado
da capital paulista. Culturas essas de ciclo curto, com retorno em tempo curtíssimo,
além de exigirem pequenas áreas. Dessa forma tinham, em pouco tempo, uma
considerável quantidade de produtos para colocar no mercado. A dificuldade
maior era a intermediação dos grandes atacadistas.
Um grande contingente
de imigrantes que haviam deixado os cafezais, estava instalada na região do
bairro da Liberdade, até hoje reduto da população de descendência nipônica. O filho
caçula de Hiromoto, Kenji, casou-se com Kimiko Fujita, filha do casal amigo
vindo no mesmo navio para o Brasil. Desde muito havia demonstrado pouco interesse
em cultivar a terra, menos ainda trabalhar para os fazendeiros de café. Procurou
no bairro japonês da capital e ali estabeleceu uma pequena mercearia. Isso no
ano de 1937. Com um caminhão ford usado, trazia do interior as hortaliças, bananas,
abacaxis e outros produtos. Em pouco tempo o movimento de seu estabelecimento
cresceu sensivelmente.
Numa de suas passagens
pelo Mercado Municipal, travou conhecimento com alguns comerciantes nipônicos
ali estabelecidos. Lembrou de lhes oferecer a possibilidade de fornecer os
produtos que trazia do interior. Poderia oferecer um preço mais acessível do
que eles pagavam aos atacadistas além de remunerar melhor os produtores. A possibilidade
de obter produtos melhores e com preço mais acessível, além da voz do sangue,
estabeleceu o relacionamento quase que imediatamente. Em poucos dias estava
empenhado em viajar constantemente para o interior para buscar produtos. Seu veículo
era pequeno e trazia uma pequena quantidade de cada vez.
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| Comércio japonês em São Paulo(Liberdade) |
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| Liberdade hoje. |
Logo conseguiu
economizar algum dinheiro e negociou um veículo de maior capacidade, além de
ser mais novo. Trazia a dupla vantagem de transportar mais e as panes eram
menos frequentes, aumentando sua capacidade de atendimento. A concorrência com
os grandes atacadistas gerou alguns atritos, mas um advogado residente nas
vizinhanças o ajudou a remover os obstáculos. Dessa forma o crescimento da
mercearia foi uma consequência imediata, tornando-se em pouco tempo um
estabelecimento de maiores proporções. Um dos principais fornecedores de
alimentos à população do bairro da Liberdade.
O português aprendido
na escola e a convivência diária na capital, ajudaram-no a dominar
suficientemente o idioma. Tinha desde criança propensão aos números,
auxiliando-o a fazer o controle de seus negócios, gerenciar os preços e lucros.
Os filhos Toshiro, Hideki e Nagori frequentaram a escola pública e mais tarde
ingressaram em escolas pagas pelos pais. Dessa forma alcançaram condições de
ingressar na universidade. Caminho seguido por todos. Toshiro cursou química,
Hideki formou-se em Biologia e Nagori completou o curso de direito.
Toshiro ingressou em
uma empresa de produtos químicos para agricultura. Sua área de atuação era o
nordeste e dessa forma passava a maior parte do tempo viajando pelo interior
nordestino. Ali não havia muito que fazer com produtos químicos, devido à
precariedade do clima. Os moradores dali tinham grandes dificuldades de obterem
o suficiente para alimentar suas famílias. Dessa forma as vendas que conseguia
realizar restringiam-se às regiões metropolitanas, além de alguns poucos
fazendeiros que haviam conseguido implantar sistemas de irrigação.
Desde criança tivera facilidade
em gravar os sabores de alimentos e bebidas. Conhecera diversas variedades de
saquê, produzido no interior paulista por alguns agricultores, em pequenos
alambiques. Aprendera a degustar e identificar as características de sabor,
textura, envelhecimento das bebidas. Em suas andanças pelo nordeste teve
oportunidade de experimentar diversas variedades de cachaça. Algumas apreciadas
em grandes regiões, outras de alcance local. Sua memória prodigiosa registrara
o sabor e o nome, bem como o tempo de envelhecimento de cada uma.
Um sucesso considerável,
apesar das dificuldades regionais, levou a indústria a trazê-lo para estados
sulinos, onde percorreu o interior do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do
Sul. Depois foi a vez de trabalhar em São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo
e Minas Gerais. Ao longo de mais de 20 anos percorreu estradas do interior,
enfrentando toda sorte de dificuldades, poeira, calor, frio, chuva e outros
obstáculos. Sempre tinha um sorriso no rosto e onde chegava não tardava em
conquistar admiradores. Alguns o chamavam de japonês sorridente.
Quando foi trazido para uma posição de chefia na
capital, havia percorrido um equivalente a muitas voltas ao redor do globo
terrestre. Veio concluir sua vida de trabalho na sede da indústria, onde usou
de sua vasta experiência no campo, em todos os estados do país, para dirigir a
equipe de trabalho, visando atender as características regionais. Não era possível
ter a mesma política de preços, quantidades de produtos para os diferentes
estados. Cada região tinha necessidades diferentes. Os parasitas não eram os
mesmos, as carências minerais e doenças eram outras. Isso exigia medicamentos
diferentes, suplementos diversos. Sem contar com a variedade de raças animais
com características próprias.
Dessa forma a empresa conseguiu uma maior penetração
no mercado em expansão. Viajou algumas vezes para regiões de expansão recente
da agricultura e pecuária, indo verificar pessoalmente as condições locais,
para depois sentar com a equipe de planejamento e traçar as diretrizes a serem
aplicadas.
Enquanto isso acontecia, Manoel continuou em sua
trajetória de trabalho e economia. Sua incursão no campo do mercado de ações
tiveram algum sucesso e ele diversificou suas aplicações. O crescimento intense
da Petrobrás e do Banco do Brasil, além de outras empresas de destaque,
permitiu a formação de um pecúlio considerável. Em 1976 recebeu de Ancede a
comunicação do falecimento do pai. Ao receber a notícia, o sepultamento havia
ocorrido algumas horas antes, não permitindo sequer a tentative de viajar para
o funeral. Projetou ma visita à família para o ano seguinte, no período de suas
férias. Em meados de 1977 viajou para Portugal, onde há três anos havia sido
deposto o regime do successor de Salazar e começava a reinar um clima de
otimismo. Passou os dias com sua mãe, já idosa e doente.
Verificou que a família no todo estava em boas condições
e poderiam se manter adequadamente. Não era necessário enviar ajuda, mas também
não dispunham de condições para lhe fornecer nenhum auxílio. Sua vida dependia
de suas próprias forças. Ao contar à mãe o montante de suas economias, ela
ficou admirada. Nenhum de seus irmãos conseguira reunir nada parecido. Mesmo assim
aconselhou-lhe a seguir assim e procurar uma mulher para se casar. Já estava na
casa dos 40 anos e deveria constituir sua família, para não ser pain a idade de
ser avô. Ele prometeu pensar no assunto.
Junto com suas economias, sabia que era participante
do programa de Fundo de Garantia desde sua criação e mais recentemente do PIS. Quando
se aposentasse poderia usar esses fundos para adquirir imóveis, montar seu próprio
negócio ou viver de rendas se soubesse aplicar de maneira adequada no mercado
financeiro. Isso era projeto para dali a uns quinze anos. Antes, se quisesse se
aposentar, poderia fazê-lo mas perderia uma parcela significativa de seu
rendimento inicial, devido à proporcionalidade.
A vantagem do FGTS era que o saldo poderia ser usado
em qualquer época na aquisição de imóveis residenciais. Estava ficando cansado
de viver, há muitos anos em pensões e pousadas. Mudara várias vezes, fizera uma
experiência de morar em forma de república junto com outros colegas solteiros. Isso
se mostrare também um problema. Havia sempre quem gostasse de levar vantagem
sobre os companheiros. Em 1980, ocorreu a eleição de João Batista Figueiredo em
substituição a Ernesto Geisel para ocupar a presidência da República, pelo colégio
eleitoral. Eleição da qual o povo não participava. A eleição era indireta. O congresso
nacional, maioria da ARENA, votava maciçamente no candidato oficial das forças
armadas. O candidato do MDB era mero coadjuvante, para legitimar o processo
como democrático. Estava longe disso na verdade.
Nessa época começou o movimento operário pela renovação
política. O embrião do partido representative dos trabalhadores nasceu, vindo
posteriormente a ser consolidado na forma do PT. Figueiredo implantou a “abertura
política” na forma de uma gradual liberalização do regime, resultando no
movimento das “Diretas Já”. Com isso ocorreu em 1985 a eleição de Tancredo
Neves e José Sarney para presidente e vice respectivamente. Em todos esses
momentos Manoel se manteve atento, mas nunca se envolveu diretamente nas
manifestações. Em 1983, ocorreu uma explosão de uma caldeira em local próximo ao
de trabalho dele.
O impacto derrubou a parede e parte do teto, ficando vários
dos companheiros de trabalho presos sob os escombros. Depois de um trabalho árduo
dos bombeiros, conseguiram resgatar todos com vida, sendo que apenas um estava
em estado crítico. Sofrera traumatismo craniano e corria risco de vida. Depois de
socorrido, Manoel foi levado para o Hospital da Beneficiência Portuguesa, onde
foi submetido a uma série de exames. Constatou-se que não sofrera nenhum
problema na cabeça, torax ou coluna. Apenas o pé esquerdo fora parcialmente
esmagado por um pedaço de concreto que o atingira. Além disso o dedo inficador
da mão direita for a decepado, deixando os demais ilesos. Tinha algumas outras
escoriações, porém nada de sério.
Após algumas tentativas de salvar o pé, os medicos lhe
comunicaram que seria necessária a amaputação dos dedos e uma parte do pé.
Ficaria em condições de caminhar, embora com alguma dificuldade. No primeiro
momento ficou abalado, mas vendo o estado de outros que precisavam amputar um
braço, uma perna, consolou-se. Fora beneficiado pela providência divina e sua
lesão era de menor monta, perto de outros deitados em leitos ao seu lado. O pé
foi amputado e uma semana depois recebeu alta. Foi preciso usar um par de
muletas por alguns dias, depois apenas uma e finalmente conseguia caminhar,
claudicando levemente.
Durante seu período de internamento os funcionários da
empresa haviam feito visitas frequentes para verificar sua situação. Era lamentável
o ocorrido e estavam a disposição para qualquer necessidade. Manoel comunicou o
fato à família só depois de já estar recuperado. A mutilação do pé permitiria
que ele continuasse trabalhando, porém a falta do dedo iria dificultar suas ações
profissionais. Dessa forma o advogado que o procurou logo depois da alta lhe
informou que poderia se aposentar por invalidez. A mutilação acidental lhe
permitiria aposentar-se sem perder nada em seus vencimentos. Poderia sacar seu fundo
de garantia, o saldo do PIS além de receber uma indenização considerável.
Embora isso lhe sugerisse que o plano que fizera para
dali a dez ou mais anos, poderia ser realizado imediatamente. De certo modo a
mutilação sofrida o beneficiara. Mesmo assim teria preferido seu corpo inteiro
e continuar a trabalhar. Gostava do que fazia. Cada peça terminada era como um
filho colocado no mundo da mecânica. Não raro se via imaginando os lugares
diversos em que estariam todas as peças que haviam saído prontas de suas mãos
ao longo dos anos. Tentava imaginar a montanha de aço que seria possível formar
com todas as suas peças produzidas.
Fazia uma ligeira conta do número médio diário e os
dias de cada semana, era possível fazer uma estimativa do total que havia
usinado em todos esses anos. Era possível haver coisas em que pusera a mão em
todos os cantos do país e até mesmo no exterior para onde haviam sido
exportados veículos. Preferiu se concentrar no presente. Precisou se acostumar
a escrever em o dedo indicador o que levou algum tempo. A letra saia um pouco
irregular na primeira carta que se animou a escrever. Endereçou-a ao irmão,
pois sabia do estadode saúde debilitado da mãe. Se ela recebesse a notícia
assim diretamente, poderia inclusive sofrer de um acidente vascular, ou cardíaco,
levando-a a morte. Se ocorresse sua aposentadoria, antes de se estabelecer com
algum negócio em definitive, faria uma visita à família. Estivera há algum
tempo flertando com uma jovem, filha de um patrício. Talvez fosse o caso de
levar isso mais a sério e talvez casar-se com ela.
Primeiro esperaria o desenrolar dos fatos. Enquanto esperava
o processo de aposentadoria encaminhado pela própria empresa, encontrou-se com
a jovem Eduarda de Almeida. Tentou seconder sua mutilação mas não teve êxito. Ela
logo percebeu e, em lugar de o rejeitar por causa disso, se compadeceu de sua
condição. Começaram a namorar e ela o apressentou aos pais. O fato de estar em
vias de se aposentar era favorável, pois a moça era filha única. Os pais
gostariam que ela ficasse morando nas imediações em que residiam. Manoel deixou
tudo em suspenso, esperando pelo desfecho do seu processo.
Qualquer decisão mais
importante seria tomada depois disso definido. Passou o tempo reaprendendo a
pedalar, agora com o pé esquerdo faltando uma parte, exercitou bastante o
corpo. Ingressou em uma auto-escola para ver se poderia tirar a carta de motorista,
mesmo depois da mutilação sofrida. Com um pouco de esforço achava que seria
possível. No começo sentiu dificuldade por ter a tendência de usar a ponta do pé,
agora inexistente, para acionar o pedal da embreagem. Aos poucos acostumou-se a
usar mais a parte posterior, próxima do calcanhar. Nos calçados enchia a ponta
com jornal, de modo a disfarçar a lesão. Quem o visse caminhando, apenas
claudicando um pouco, dizia que tinha algum problema de quadril ou mesmo de
joelho.
Depois de algum tempo,
poucos dias antes de fazer a perícia para deferir ou não sua aposentadoria,
realizou com êxito o exame de motorista e menos de uma semana depois recebia em
seu endereço o documento que o habilitava a dirigir veículos automotores
pequenos. Não poderia dirigir caminhões ou ônibus. Poderia mudar de categoria
depois de permanecer na inicial durante cinco anos. Não tinha essa pretensão.
Um automóvel ou caminhonete era mais que suficiente para ele. Com certeza não
nutria o desejo de sair pelas estradas do país ao volante de um caminhão de
cargas.
Quando se submeteu à
perícia, tinha em mãos o atestado médico indicando as lesões sofridas e em
poucos minutos estava aprovado seu processo. Poderia esperar pela correspondência
que lhe levaria o resultado final e a agência bancária para poder receber seus vencimentos.
Também havia sido avaliado o dano sofrido e estabelecida a indenização
correspondente. Levou um leve susto quando soube que receberia pela parte do pé
e o dedo decepado o valor equivalente a 150 vezes o seu salário no momento do
acidente. Isso significaria um montante bem além de tudo que conseguira
economizar até o presente momento, mesmo com seus investimentos na bolsa de
valores, onde nunca deixara de ter algum lucro, mesmo nos momentos mais críticos.
Não perdere dinheiro, quando muita gente amargava sérios prejuízos em diversas
ocasiões. Isso era um fato importante.
Decidida a questão de
sua aposentadoria, procurou uma agência de automóveis. Olhou bem os novos,
experimentou pois agora era motorista habilitado e podia testar o que tinha
intenção de comprar. Também foi aos revendedores de usados, com um ou dois anos
de uso. Comparando a diferença de preço e as possíveis despesas de manutenção
com os usados, chegou à conclusão de que era mais vantajoso adquirir um novo. Verificou
seu saldo na CEF e constatou que poderia comprar vários automóveis e ainda
sobraria um bom dinheiro. Decidiu-se pela comprá de um da marca Chevrolet,
modelo Opala, quatro cilindros e duas portas. Ficou indeciso com a cor e por
fim optou por um de cor bege. O branco era muito suscetível à sujeira,
aparecendo qualquer coisa que houvesse.
Havia feito uma transferência
da conta poupança para a conta corrente e pagou com um cheque. Na própria agência
fez contato com um despachante para encaminhar o emplacamento, bem como um
seguro total, para se precaver contra roubos e eventuais acidentes. Feito isso,
saiu passeando alegremente com seu automóvel. Parou diante de um estúdio fotográfico
e pediu ao profissional para tirar diversas poses com ele ao lado do carro,
sentado ao volante, embarcando e desembarcando. Feito isso ficou satisfeito e continuous.
Foi fazer uma visita à dona Marinês, agora idosa e tendo posto a pensão aos
cuidados de uma neta. Ficou contente ao ver o antigo inquilino. Lamentou o fato
de ter sofrido o acidente, mas se alegrou com sua aposentadoria a significativa
indenização que iria receber.
Levou a velha senhora a
dar uma volta em seu carro, depois a deixou novamente em casa. Voltou ao
pensionato onde morava atualmente, depois passou na casa da namorada Eduarda para
lhe mostrar sua aquisição. Levou a família para passear no final de semana em
Santos. Procurou pelo antigo companheiro, mas ficou sabendo que o mesmo viera a
falecer alguns meses antes. Deixara a esposa e três filhos já crescidos. Viviam
e trabalhavam no mesmo estabelecimento, um pouco ampliado com que o amigo havia
iniciado tantos anos antes. Hospedaram-se em um hotel de porte médio, passearam
na praia, tomaram banho de mar e no domingo à noite retornaram a capital.
Na segunda feira
recebeu o aviso do dia em que seria depositado em sua conta bancária, bem como
o dia em que seria depositado o montante da indenização. Pouco depois foi até a
empresa se despedir dos antigos colegas, rever os funcionários administrativos
com quem havia tido contato. Agradeceu pelo bom relacionamento que haviam lhe
dispensado durante os longos anos de convivência. A partir de agora viveria uma
vida diferente. Sabia que sentiria saudades das máquinas suas companheiras por
tantos anos. Mais de uma vez haviam sido substituidas por outras mais modernas
ao longo de sua vida profissional desenvolvida toda ali na mesma empresa. Eram praticamente
vinte e cinco anos.
Poderia começar a
procurar uma casa para comprar, ou um negócio que estivesse à venda. Poderia ser
uma mercearia, um bar, ou uma loja de aviamentos ou coisa semelhante. Tinha tempo
para procurar. Não necessitava ter pressa.
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| Barri da Liberdade nos dias de hoje. |
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| Imigrantes cultivando batatas. |
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| Família de imigrantes cultivando bananas. |
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