1.
Preparativos
para o casamento
Na terça pela manhã, bem cedo, Gaudêncio
estava na estrada rumando para a fazenda Santa Maria. A ordenha da manhã ainda
não terminada quando ele encostou a caminhonete nas proximidades. Maria
Conceição o viu e veio ao encontro dando-lhe um abraço. Sempre que o filho se
ausentava, a saudade batia forte. O rosto sorridente do filho a fez adivinhar
que a missão com que ele fora a capital havia sido coroada de êxito. Em outras
palavras, o casamento tinha sido marcado. Faltava apenas saber qual o dia
escolhido e o local da comemoração. Ela ardia de vontade de perguntar, porém
preferiu aguardar ele falar e satisfazer sua curiosidade.
Começou falando que haviam nascido vários
bezerrinhos das novilhas adquiridas no mês de janeiro. Ainda não estavam
aproveitando o leite, pois nos primeiros dias ainda desce o colostro o que
torna o produto inservível para a indústria de laticínios. Dentro de uns 5 ou 6
dias haveria um razoável incremento na produção de leite. Mais um grupo estava
na iminência de parir de hoje para amanhã. Dava bastante trabalho, mas era
muito bonito ver os pequenos bichinhos começar a caminhar tropegamente, depois
começar a se alimentar, aos poucos começar a se firmar e dar os primeiros
pulinhos, uma e outra corridinha.
Nesse momento Pedro Paulo também se
aproximou e não esperou:
- E então, filho? Casamento marcado?
Podemos começar a preparar a festa?
- E vocês duvidaram?
- Não que nos duvidemos, mas sempre fica
uma pontinha de dúvida, né.
- Pode
preparar a fatiota, bota nova, lenço vistoso para janeiro, papai. Satisfeito?
- Pensei
que ia ser logo. Só em janeiro? – falou Conceição.
- É que
para julho ia ser muito pouco tempo. Depois eu tenho aula, a Ângela também, não
daria certo perder muitos dias. Foi a melhor época. Dia 10 de janeiro, está
bem?
- Ótimo,
filho. Assim dá tempo de fazer tudo com calma. Já falou com seu padrinho?
- Já. Ele
ficou contente. Também imaginou que gente ia casar logo agora, dentro de uns
dois ou três meses, mas no fim também ficou contente.
- Qualquer
dia é bom. O importante é que esteja tudo dentro dos conformes. Como manda a
lei e os bons costumes.
- Tudo na
melhor ordem, mãe. Não poderia ser melhor, pode ter certeza.
As últimas
vacas terminaram de ser ordenhadas e o encarregado do serviço assumiu a
conclusão de tudo. O transporte do leite logo estaria ali para levar a produção
da noite anterior e a de agora pela manhã. Os três foram para a casa, onde
havia água quente no fogão, a cuia preparada para o mate que logo foi cevado e
rodou entre eles. Maria Conceição usou a água de outra cheleira para coar café e
pôs leite para aquecer. Retirou o pão caseiro do armário, colocou sobre a mesa
também o queijo, nata guardada na geladeira, melado comprado da região mais ao
norte, onde se cultivava cana de açúcar. Depois sentou por uns minutos
esperando o leite dar sinal de ferver. Era o momento crítico. Um descuido e
derramava um bocado sobre o fogão, sujando tudo.
Pedro se
encarregou de contar as demais novidades ocorridas no final de semana. Haviam
remanejado o gado de corte para outra invernada onde o pasto estava mais forte
e não causaria atraso no processo de engorda. O capim na área de arroz estava
bem crescido. Logo poderiam colocar o gado para pastar naquela área. Assim, na
época de plantar o arroz, não haveria muito que eliminar para permitir o
plantio. Além de alimentar o gado, limpava o terreno.
Gaudêncio
estava cada vez mais envolvido com suas aulas, leituras, exercícios para
resolver e estudar para as provas. Havia obtido resultados muito bons no
primeiro bimestre e as provas do segundo estavam próximas. Havia trabalhos por
fazer, trazia livros da biblioteca da escola, outros encontrava na biblioteca
municipal, ou comprava na livraria. Por graça de seu padrinho, podia dar-se
esse pequeno luxo. Assim ia formando uma biblioteca própria, juntando livros de
literatura e assuntos diversos. As revistas sobre agricultura que, embora
poucas, traziam informações importantes e ele as reunia em ordem cronológica,
separando por categoria. O que antes não merecia um mínimo de sua atenção,
agora estava ocupando uma das primeiras posições.
À todas as
ocupações já existentes em sua vida, viera somar-se a preparação para o
casamento. Nas próximas semanas, na ocasião de ir a cidade para algum assunto
relativo à fazenda, aproveitaria para falar com o padre da matriz. Iria até o
fórum pedir informações sobre os trêmites para o casamento no civil. Assim não
teria surpresas quando fosse a hora de encaminhar a documentação.
No dia da
chegada, depois de colocar em dia as novidades, foi com Pedro Paulo
supervisionar todos os setores da propriedade. Verificou as providências a
tomar com relação ao gado de todas as categorias. Questões relativas a limites
de pastagens, manejo do gado entre as invernadas, cuidados com as vacas de
leite, especialmente as novilhas que estavam parindo naqueles dias. Encontrou
uma quinzena de bezerros de poucos dias, boa parte de fêmeas. Os machinhos
iriam fazer parte do gado de corte, no momento em que estivessem em idade de
sobreviver apenas pastando. Já as fêmeas teriam seu desenvolvimento acompanhado
de perto, para separar aquelas que apresentassem melhor conformação visando a
reprodução. Iriam substituir as que agora produziam e iriam atingir a idade em
que sua produtividade começa a declinar.
Estava
lendo em uma das revistas um artigo falando de um sistema de controle dessa
parte, visando a melhoria do aproveitamento geral. Depois que dominasse o
assunto e depois de se aconselhar com o veterinário da cooperativa, implantaria
o sistema na fazenda. Seria uma carga a mais de trabalho, mas pelo que havia
lido, traria retorno certo. Talvez, depois de casado, a esposa poderia ajudar
nessa parte mais burocrática, nos momentos em que não estivesse ocupada com
atividades de sua profissão. Se não fosse possível, contrataria um funcionário
ou funcionária para fazer esse trabalho.
A
cooperativa estava cadastrando todos os plantadores de arroz que iriam aderir
ao sistema de criação de peixes nos arrozais. Queriam saber as áreas envolvidas
para fazer a previsão do número de alevinos necessários. Um convênio com a
associação de pescadores havia sido firmado, estando o trabalho de ampliação e
melhoria das instalações em andamento. Haveria necessidade de uma área de
estocagem bem mais ampla, uma vez que previam uma elevação gigantesca da
quantidade de pescado produzido. Para isso havia necessidade de conhecer com
bastante precisão o volume total que poderia ser esperado ao final do ciclo.
Eram
frequentes as visitas de proprietários da redondeza à fazenda para verem com os
próprios olhos e esclarecer dúvidas com quem tinha pelo menos um ano de
experiência na atividade. O mês de junho foi bastante cansativo para nosso
jovem estudante, administrador de fazenda, noivo e agora mesmo interessado de
alguma forma em pesquisas. Tinha sede de inovações e nada que lhe parecesse
interessante era deixado de lado, sem ao menos uma criteriosa análise.
Joaquim
ficava cada vez mais folgado. Bendizia o fato de ter nomeado o afilhado seu
herdeiro. Ele agora assumia toda a carega de trabalho, trazendo a ele apenas as
questões já mastigadas, para obter o seu aval antes de iniciar alguma mudança
mais significativa. Resolveu no segundo semestre realizar mais uma viagem ao
exterior. Dessa vez conheceria os países da América do Sul, começando pela
Argentina, depois Chile e pelo menos as capitais dos outros. Talvez incluísse a
América Central no roteiro. Procurou uma agência de viagens existente na cidade
em busca de informações sobre passagens, hospedagem e lugares interessantes.
Depois dessa fase, definido o roteiro, preparou-se para partir no final de
agosto. Queria estar de retorno final de outubro, começo de novembro.
Enquanto
isso, no mês de julho Gaudêncio fez outra visita à capital para ver a noiva.
Queria combinar a época em que ela viria para São Borja para encaminharem a
documentação para o casamento. Na ocasião o general não veio no final de
semana. Ficou retido em reuniões emergenciais na capital federal. Estando
apenas a mãe Lourdes e a filha Ângela, aproveitaram para fazer uma excursão à
região de Garibaldi e Bento Gonçalves. Sabiam que ali nessa época o clima,
devido ao frio era bem agradável. Combinava boa comida, vinhos da região e
lugares muito pitorescos.
Voltaram
somente na segunda-feira pela manhã. Ficou combinado que se encontrariam na
Semana da Pátria em São Borja e encaminhariam os documentos. Não haveria demora
e talvez Ângela precisasse perder apenas um dia de aulas, o que não
representaria grandes problemas. Retornou para casa na terça-feira após o
almoço. Nesse tempo as novilhas adquiridas estavam todas em plena produção de
leite. Algumas das mais velhas, já um tanto decrépitas tinham sido descartadas.
Não era mais compensador mantê-las no plantel. De tempo em tempo mais uma outra
novilha criava, pois tinham sempre algumas provenientes das antigas produtoras
de leite.
Uma das
providências a tomar seria fazer grupos de matrizes para escalonar as épocas de
cria e assim conseguir manter um nível de produtividade mais uniforme durante o
ano inteiro. Isso representava uma remuneração melhor do leite no período
inteiro. Quem produzia bem no verão e tinha queda acentuada no inverno, era
remunerado bem pela média do inverno, tendo um desconto significativo pelo
volume restante. Cada centavo perdido, representava prejuízo no final do mês.
Se conseguisse planejar a época de cria e produção plena das matrizes, seria
possível fazer com que o volume maior fosse exatamente nos meses de inverno. Na
situação ideal não haveria variação.
Antes de
embarcar para a sua viagem, Joaquim determinou ao afilhado que não deveria se
preocupar com casa para morar depois de casar. Bastaria conservar o seu quarto
na casa e poderiam ocupar o resto sem reservas. Ficaria mais tempo na cidade ou
viajando, o que tornava desnecessária a eventual construção de uma residência
para o jovem casal. Deveriam aproveitar a ocasião da vinda de Ângela em
setembro para planejarem as reformas que iriam querer fazer e dar andamento ao
processo. Assim, quando ele voltasse e o enlace estivesse perto estaria tudo
pronto. Gaudêncio comunicou à noiva esse detalhe. Ela, no primeiro momento
falou que nem iria querer reformar nada. Decidiram que falariam sobre isso na
hora certa.
O final de
agosto chegou e Joaquim passou para o lado Argentino, de onde embarcou em um
ônibus indo até a primeira estação da estrada de ferro. Dali viajo de trem até
Buenos Aires, fazendo escalas em diversos localidades ao longo do caminho. Da
capital viajou de avião à capital do Chile e depois percorreu os principais
lugares dignos de serem vistos, de ônibus. Visitou as capitais dos demais países.
No Perú foi conhecer Machu-Pichu. Subiu ao deserto do Atacama. Na América
Central visitou a Nicarágua, Costa Rica e Panamá e México. Ficou tentado a dar
um pulo em Cuba, mas desistiu no último momento. Voltou no final de outubro,
quando o arroz já estava plantado e em alguns dias chegariam os alevinos. Seria
um momento histórico, pois a quantidade de pequenos peixes que seriam soltos
nos cultivos de arroz, era algo descomunal.
Enquanto
Joaquim viajava, chegou a semana da pátria e Ângela veio para a fazenda. A mãe
por sua vez viajou para Brasília ao encontro do marido. Nos dias de sua
permanência, para não causar falatórios, Maria Conceição e Pedro Paulo ficaram
hospedados na casa grande, ocupando um dos quartos de hóspedes. As pequenas
alterações sugeridas pela noiva foram insignificantes aos olhos de Gaudêncio.
Ele esperava uma mudança mais profunda, mas não foi isso que ocorreu. Ela achou
tudo muito bom. A maior mudança foi uma nova pintura, trocando a cor de algumas
dependências, detalhes como o tom das janelas e portas deram um aspecto mais
alegre à residência. Em pouco mais de um mês tudo havia sido feito. Ele tirou
fotografias e mandou revelar. Depois enviou por correio para ela ver como havia
ficado.
Ao
telefone ela lhe informou que estava perfeito. Alguma coisa que precisasse ser
mudada depois, poderia ser feito com tempo e calma, sem atropelos. Iriam
escolher em desembro alguma coisa no quesito móveis para harmonizar a nova
pintura com a decoração em geral. A documentação havia sido encaminhada e
estava tudo pronto e previsto. Os convites haviam sido encomendados no local e
apenas o número necessário para os amigos e parentes da noiva foram levados por
Gaudêncio em sua próxima visita, logo no começo de novembro, após a volta de
Joaquim.
As atividades
de instalação na associação de pescadores estavam a pleno vapor. Teriam ainda
que fazer testes, corrigir eventuais problemas que surgissem, antes de
receberem o imenso volume de pescado previsto. Ocorreu naquele ano um fluxo
considerável de moradores da cidade em visita às fazendas para verem o
movimento constante dos peixinhos nas águas que envolviam os pés do arroz.
Formavam um espetáculo só possível de ver nesses lugares. Houve que repetiu a
visita com algumas semanas de diferença, encontrando uma enorme diferença entre
o tamanho dos peixes. Pareciam crescer a olhos vistos. Os próprios fazendeiros
acompanhavam o desenvolvimento com curiosidade. Era algo difícil de acreditar
que aqueles pequenos pontinhos escuros na água, em pouco mais de dois meses estavam
muitas vezes maiores.
O estoque
de pescado feito no início do ano, estava terminado. O produto caira no gosto
da população, passando a ser bastante procurado. Quando os últimos pacotes
foram vendidos, os pescadores, os consumidores e comerciantes passaram a
esperar ansiosos pelo dia em que pudessem novamente contar com o produto.
Os
convites para o casamento haviam sido enviados ou entregues em mãos aos
convidados, as roupas para a ocasião estavam sendo confeccionadas. Muita gente
mandou fazer roupas novas, elevando bastante a quantidade de encomendas
recebidas pelos alfaiates, costureiras e mesmo sapateiros. Havia os que faziam
sob medida as botas para muitos clientes há muitos anos e era preciso
encomendar com muita antecedência. Quem queria estar com uma bota nova,
reluzente e diferente sabia que precisava tratar do assunto com tempo hábil
para ficarem prontas. Também havia os usuários de guaiacas, igualmente feitos
sob encomenda. Uma guaiaca nova demorava alguns dias para ficar pronta. Um
volume elevado, tornava a espera bem maior.
Dessa
forma, em dezembro chegaram Ângela e sua mãe Lourdes para a escolha dos móveis
do quarto e alguma coisa a ser trocada no restante da casa. Gaudêncio as levou
às lojas da cidade e procuraram pelos artigos que fossem de seu agrado. Como
estavam ainda no começo do mês, ocorreu à ele procurar uma marcenaria e ver se
haveria possibilidade de fazer alguma coisa sob encomenda, pois estava difícil
encontrar o que tinham em mente. Mediante a promessa de um pagamento adicional
conseguiram o milagre. O marceneiro os acompanhou à fazenda e tomou as medidas.
Assim faria tudo sob medida o que daria um toque pessoal ao ambiente.
Passaram
mais tempo passeando e conhecendo a cidade do que fazendo compras. Não tinham
necessidade de adquirir louças, utensílios e demais pertences da casa. Havia
tudo e até em excesso. Nunca usariam tudo o que tinha naquela casa. As roupas
para a cama seriam compradas na capital, onde existia maior diversidade de
produtos, escolha de cores e marcas. Na volta para a capital Ângela iria
experimentar o vestido e fazer as últimas provas para conclusão de seu terceiro
ano de faculdade. Gaudêncio terminara de fazer as provas do quarto bimestre e
fora aprovado por média. Nenhuma prova final, ou recuperação a fazer. Estava
bastante envaidecido com isso e recebeu congratulações de Joaquim, bem como de
Ângela ao chegar.
Ele fez
questão de levar a noiva para conhecer alguns dos professores da escola que
estavam em atividade, atendendo os alunos que ainda batalhavam para conseguir
sua aprovação. Os elogios que recebeu foram unânimes de todos os lados. Ângela
foi convidada a fazer parte do quadro funcional da escola ou outra na cidade,
quando concluísse sua formação. Ao saberem do casamento em janeiro, imaginaram
que ela iria desistir da faculdade. Ficaram encantados com a solução que haviam
encontrado para não pararem de estudar. Ali estava um casal que, além de se
amar, olhava par ao futuro. Certamente teriam um belo porvir.
O mês de
janeiro passou e chegou o início do ano. Poucos dias separavam o casal da hora
marcada. A família de Ângela chegou no dia 5 e ficou hospedada na casa de
Joaquim na cidade. Era mais conveniente. A noiva viria de uma casa e o noivo de
outra. Depois de casados seguiriam para a fazenda onde aconteceria a festa,
seguida de fandango e muita brincadeira. Alguns presentes começaram a chegar de
diferentes procedências, sendo entregues em veículos de entrega. Os convidados
faziam as compras numa mesma loja e assim a entrega era feita de uma vez,
trazendo os cartões de felicitações de quem os ofertava.
No dia
marcado, uma Ângela radiante e brilhante em seu vestido simples, mas de muito
bom gosto. Uma grinalda singela com algumas brilhantes pedrarias e com um véu
discreto, completavam sua indumentária. O noivo estava ligeiramente
desconfortável em seu terno, vestuário que poucas vezes usara até aquele dia. A
camisa, imaculadamente branca e a gravata eram para ele um pequeno tormento.
Mas nada lhe tiraria a alegria de estar devidamente trajado para receber por
esposa a eleita de seu coração.
A igreja
estava repleta de convidades e alguns curiosos, o Padre e o Juiz estavam a
postos para realizarem simultaneamente a cerimonia religiosa com a civil. No
momento das palavras “pode beijar a noiva”, os dois se olharam fundo nos olhos
e depois de um momento, se abraçaram carinhosamente, trocando um beijo ardente.
As palmas soaram no recinto da igreja e logo iniciaram o processo de
assinaturas dos documentos, a presença das testemunhas, dos pais para depois
iniciarem o desfile pelo corredor até a porte, de onde o padrinho Joaquim os
levaria de automóvel para a fazenda. Formou-se um longo cortejo no caminho da
fazenda. Boa parte dos convidados que conheciam o caminho, iam à frente. Os
demais seguiam após o carro que levava os noivos.
Na
fazenda, o grande galpão estava limpo e ornamentado para festa. Ao lado, um
imenso fogo de chão dava conta de assar uma grande quantidade costelas inteiras
no mais tradicional estilo gaúcho. Em uma churrasqueira próxima estavam sendo
assadas as carnes diferentes como picanha, galeto, carne de porco, linguicinha
e miúdos de frango. Logo na chegada os convidados eram recebidos com uma porção
de linguiça assada, um copinho com vinho ou uma cerveja para acompanhar. As
crianças e adolescentes tinham ao seu dispor vários tipos de refrigerantes. A
chegada dos noivos foi saudada com uma ensurdecedora salva de fogos de
artifício. Os músicos tocaram e cantaram Parabéns pra vocês, depois outras
músicas próprias para a ocasião.
Poesias
foram recitadas, alguns pequenos discursos pronunciados e a seguir Joaquim, em
nome dos pais dos noivos, convidou a todos para buscarem assento nos bancos que
ladeavam as muitas mesas disponíveis. Os noivos, padrinhos, pais, amigos mais
chegados, tinham uma mesa especial. Logo depois iniciou-se a tarefa de servir
os acompanhamentos para a grande quantidade de carne assada. Num vaivém
ininterrupto os encarregados desse serviço, levavam e traziam os enormes
espetos com as costelas, cortavam a cada um o pedaço escolhido. Seguiam em
frente até o momento que era visível o resfriamento. Era então levado de volta
ao fogo e logo outro espeto estava nas mãos do servente sendo levado aos
comensais.
Quando
ninguém mais aguentava engolir um pedacinho de carne sequer, ainda havia uma
boa quantidade dela pronta para ser consumida. Foi o momento de servir a
sobremesa e mais um pouco de bebida. O consumo abundante de carne e
acompanhamentos, parecia neutralizar o efeito do álcool do vinho e da cerveja.
Havia sim um e outro leventente alegre, nada porém que fosse preocupante.
Diversas brincadeiras com os noivos foram feitas, tais como cortar a gravata e
vender em pedacinhos, leiloar o sapato da noiva. Quem o arrematasse tinha o
direito de colocar o sapato no pé dela. Evidentemente sob a supervisão do
noivo. A grande quantidade de comida e bebida, fez efeito. Não tardou para
serem vistos inúmeros dorminhocos espalhados por todos os lugares que se
prestassem para tirar uma soneca.
Quando os
músicos começaram a executar toda variedade de músicas e as mesas foram
removidas do centro do galpão, começou o fandango. A dança dos noivos, a dança
da noiva, do noivo, igualmente leiloados entre os homens e as mulheres. O
vencedor do leilão ganhava o direito de dançar a música com a noiva ou noivo,
conforme o caso. As brincadeiras se sucederam tarde afora. Danças típicas,
demonstrações de danças flocfolclóricaso a chula, sapateado e outras. Uma
sessão de repentistas teve lugar, até que foi anunciada a hora do café da
tarde. Primeiro foi cortado o bolo de casamento, muitas fotografias tiradas,
filmagens feitas para guardar e mostrar aos filhos, talvez netos um dia.
O
entardecer se aproximava e os convidados continuavam a dançar e comemorar.
Depois de atender a todos os amigos e convidados, os noivos conseguiram sair
discretamente no meio da balbúrdia geral. Trocaram de roupas na casa e foram,
no início da noite, para um hotel na cidade. Ali passariam a primeira noite de
casados, aguardando o avião no dia seguinte para a capital. Dali iriam para a
Europa. Lá era inverno e teriam tempo de ficarem sossegados em um quarto quente
de hotel ou poderiam apreciar alguma coisa da paisagem dos montes cobertos de
neve. Se houvesse disposição iriam até uma estação de esqui. Ângela falava
suficientemente bem o inglês para não terem problemas de comunicação.
Quando a
grande maioria do povo percebeu os noivos haviam sumido. Iniciou-se uma procura
desenfreada e nada encontraram. Tinham planejado seguir com o fandango até
altas horas da madrugada, não deixando os dois se recolher. Olharam-se uns aos
outros e, vendo frustrado seu intento, decidiram por vingança seguir com a
festa assim mesmo. Realmente os últimos deixaram a propriedade quando o dia
seguinte estava amanhecendo.
Não havia
sobrado nenhum pedaço de carne, nem garrafa de cerveja, vinho ou refrigerante.
No vinal, para completar, até mesmo os biscoitos existentes, geralmente
relegados ao segundo plano no quesito comilança, foram atacados. Deram cabo de
tudo.
- Ainda
bem, - falou Pedro Paulo, vendo o resultado. – Não tem garrafa cheia para
devolver. Estão todas vazias. A carne terminou, as bolachas, bolos e outras
coisas, foi tudo comido. Não há risco de algo ser jogado fora.
- Agora
sim, meu velho! Estamos nós dois outra vez. Do mesmo jeito que começamos há
tantos anos.
- É a
norma da vida, Ceição.
- O casal
começa sozinho e termina sozinho.
- Vamos
agora esperar os netos.
- Deixa
eles terem um tempo para gozarem um pouco a vida. Essa história de logo encher
barriga não está mais na moda. Ela está levando pílula para evitar ter filho
logo. Ainda tem um ano de faculdade por fazer. Depois eles vão pensar em ter
filhos.
- Mas esse
mundo não é mais o mesmo. No nosso tempo a gente logo queria ter filho. Nós é
que não tivemos sorte. Mas está muito do bom. Pra compensar vamos ter uma
porção de netos.
- Que Deus
lhe ouça, meu bem.
Na cidade,
depois do sol nascer, os recém-casados estavam se preparando para irem ao
aeroporto pegar o avião. Depois do almoço embarcariam para São Paulo, Rio de Janeiro
e por fim Recife, antes de tomarem o caminho da Europa. Conferiram todos os
documentos. Passaportes, passagens, comprovantes de reservas de hotéis, vistos
dos países que pretendiam visitar. Cheques de viagem em dólares, com vários
valores individuais para facilitar o pagamento de contas de diferentes valores.
Levavam também uma determinada quantidade de dinheiro em dólares para despesas
urgentes, quando não fosse possível usar o cheque de viagem. As malas estavam
prontas, conferidas e eles chamaram um carregador para levar tudo até um taxi
que os deixaria no aeródromo. Haviam se despedido de todos os familiares e
estavam sozinhos nesse momento, por escolha própria.
Pontualmente
às 10h15 minutos foram chamados para o embarque. Quando os ponteiros indicavam
10h e 40 minutos o avião decolava rumo a Porto Alegre, fazendo no caminho uma
escala em Santa Maria. Pouco após o meio dia desembarcavam na capital. Ali
mesmo encontraram um restaurante para almoçar, pois o voo da conexão sairia às
14h 45 minutos. Não havia tempo a perder.
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